Rita Lee no Coliseu de Lisboa

Casa quase cheia no regresso da espalha-brasas a Portugal. Nem Scolari escapou à língua viperina da brasileira.


Luiz Felipe Scolari e Yoko Ono foram algumas das "vítimas" de Rita Lee, ontem à noite, no Coliseu dos Recreios, em Lisboa. Aos 60 anos, a cantora brasileira mostrou não ter perdido pitada do seu sentido de oportunidade, nem do seu bom humor, e presenteou um coliseu que quase encheu com um espectáculo de grandes êxitos e grandes tiradas.

Entre o brega e o chique, digamos assim em honra não só a Rita Lee como à nacionalidade de boa parte dos espectadores, a ex-Mutantes sempre pendeu mais para uma certa loucura sem classe popular definida. Ontem à noite, o desprezo pelo "bom gosto" começou logo pela abertura: antes da primeira música - o fantástico "Flagra" - se escutar em palco, uma das dançarinas de Rita Lee protagonizou um inesperado número de strip (não integral), ao som de "Big Spender".

Do cabaret passámos não para o convento, mas para um clube rock que levou ao delírio os trintões e quarentões da plateia. Acompanhada por uma banda onde militam o seu filho, Beto Lee, e o marido de há 32 anos, Roberto de Carvalho, Rita Lee começou por agradecer aos presentes a companhia. "Saíram do conforto dos vossos lares sagrados! Podiam estar tomando sorvete ou vendo novelas brasileiras, mas vieram me ver", brincou. "Eu sou uma pessoa que paga para não sair de casa e vocês pagaram para sair!".
De camisa colorida, colete preto e chapéu na cabeça, Rita Lee apresentou então vários dos seus êxitos a solo, como "Nem Luxo Nem Lixo", "Saúde", "Mutante", "Ôrra Mey" ou "Amor e Sexo". Infelizmente, a maravilhosa leveza de muitos destes temas saiu algo amarrotada pelos acessos de "guitar hero" do filho de Rita Lee, a quem a sexagenária agradeceu, a certa altura, por lhe ter dado o maior presente da sua vida: a neta Isabela.

Na plateia, o ambiente fazia lembrar o de uma dancetaria à moda antiga. Aos passos de dança em estilo no mínimo livre juntavam-se as tentativas, por parte dos machos ainda com farpela de trabalho, de emparelharem com as moças sozinhas e - também - dançantes.

Mas um concerto de Rita Lee não fica completo sem uma muito bem-vinda dose de disparate. Ontem, a "vovó Ritinha", como recentemente se referiu a si mesma numa entrevista à BLITZ, contou como aos 28 anos se sentia mais velha do que nunca. "Olhava no espelho e via a Madre Teresa de Calcutá. Já pensava em fazer testamento, procurar asilo. Hoje, 30 e alguns anos depois, me sinto a avó de Madre Teresa de Calcutá", ironizou antes de louvar os benefícios da idade e deixar a sua "mensagem" aos jovens: "Jovens, envelheçam!".

Mais momentos de risota: a versão forró, e caprina, para "I Wanna Hold Your Hand" (" O Bode e a Cabra "), com um "foda-se a japonesa!" para a viúva de Lennon, que terá inviabilizado a edição desta versão "rural" dos Beatles; o inédito "Tão", dedicado àquelas pessoas "tão boazinhas que dá vontade de esganar", ou a menção a Luiz Felipe Scolari ("vai ensinar os gringos, que inventaram o futebol, como se joga futebol!").

O alinhamento contemplou ainda algumas surpresas, como uma versão de "Roll Over Beethoven" de Chuck Berry ("velhinho danado, aos 81 anos! Mais velho que eu!") e das brasileiras Frenéticas, aqui recordadas com "Vingativa", teatral canção para três vozes (a de Rita Lee e a das suas dançarinas).
As baladas entoadas em coro pela parcela feminina do público e os êxitos reservados com sabedoria para o encore ("Mania de Você", "Banho de Espuma", "Desculpe o Auê", "Papai me Empresta o Carro", "Erva Venenosa" e, a finalizar, a deliciosa "Lança Perfume") deram a estocada final num bom concerto de Verão - despretensioso, relaxado, feliz.